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Gestão deve priorizar a comunicação “olho no olho”

É um equívoco acreditar que tecnologias digitais de comunicação representam necessariamente comunicação mais eficiente
26 de fevereiro de 2019

Não é novidade que as tecnologias digitais de comunicação à distância são hoje uma realidade cotidiana na maioria das empresas, muitas vezes, inevitáveis, dada à distância física com que as pessoas trabalham dentro de uma mesma companhia. Mas é um equívoco acreditar que isso representa necessariamente uma comunicação mais eficiente.

Uma pesquisa recente feita numa parceria entre universidades no Canadá e nos EUA concluiu que falar pessoalmente é 34 vezes mais eficiente do que mandar um e-mail.

Isso tem muita ver com o modelo de gestão que uma organização adota. A gestão mais tradicional, com raízes burocráticas e de produção em massa, tende, no geral, a não se importar se a comunicação entre as pessoas é feita pessoalmente ou utilizando meios digitais de comunicação à distância. Em algumas organizações há, inclusive, um estímulo para a utilização dessas ferramentas – como e-mails, planilhas, relatórios, vídeo conferências, etc.

Já na gestão lean há outro tipo de mentalidade. Como se trata de um modelo de gestão que prioriza ir ao gemba – ao local onde ocorre o trabalho, onde acontece a produção, a agregação real de valor, para ver os problemas com os próprios olhos –, é natural a tendência a haver uma comunicação mais presencial entre as pessoas, sempre que isso for possível.

No sistema lean há, inclusive, um conceito muito específico que, de certa forma, estimula as pessoas a conversarem presencialmente sobre os problemas. Trata-se do “nemawashi”, uma expressão japonesa que pode ser traduzida como “preparar o solo para o plantio”.

Trata-se da prática que preconiza que, antes de elaborar um projeto ou executar uma ação, é preciso conseguir a aceitação, a pré-aprovação acerca disso com as pessoas envolvidas. Assim, um gestor lean, antes de fazer qualquer coisa, deverá contatar as pessoas para explicar a elas as ações, colher opiniões e visões, coletar informações adicionais que possam melhorar o que se quer fazer, reconhecer resistências e reformular prioridades.

Ou seja, preparar o terreno para que, quando se execute a ação, haja o mínimo possível de resistências ou falta de apoio, diminuindo, consequente, os retrabalhos e as chances daquilo não funcionar.

E para se fazer um bom nemawashi, nada melhor do que falar pessoalmente, olho no olho, ao vivo... porque, segundo os teóricos da comunicação, trata-se do jeito mais “quente”, mais completo e mais rico de se comunicar. Embora, muitas vezes, isso não seja possível, dadas as condições estruturais e ambientais, no sistema lean a comunicação pessoal é sempre uma prioridade natural desse modelo de gestão. Sempre que for cabível, é preciso ir ao gemba: ver com os próprios e também “conversar”, ouvir as pessoas nos seus locais de trabalho, para entender seus pontos de vista, dificuldades etc..

Já numa gestão mais tradicional é comum, por exemplo, as pessoas trabalharem uma ao lado da outra, mas se comunicarem mesmo por email. Ou então, se informarem sobre um problema por meio de relatórios e planilhas “frias”, sem jamais ter ido, de verdade, ao local onde ocorrem as falhas para falar com as pessoas envolvidas e saber a opinião delas.

Se na sua empresa isso ocorre, se as pessoas só se comunicam usando tecnologia e sempre à distância, mesmo em ambientes onde poderia ocorrer um relacionamento mais presencial, saiba que seu modelo de gestão está perdendo uma excelente oportunidade. A de tornar os trabalhadores muito mais eficientes porque se comunicam “olho no olho”.

*Flávio Picchi é presidente do Lean Institute Brasil e Prof. Dr. da Unicamp